No dia 30 de setembro de 2005, o marceneiro Antônio Pereira de Moura renasceu pela terceira vez. É que nesta data, no Hospital Dr. Carlos Alberto Studart Gomes, em Fortaleza, Antônio recebeu seu segundo transplante coração, isto é, aquele que seria o terceiro coração de sua vida, e com o qual vive até hoje.
Em 4 de janeiro de 1999, Antônio se tornou primeiro paciente a realizar um transplante cardíaco integralmente na rede pública de saúde do Ceará. Em 2005, após o primeiro coração transplantado apresentar problemas, ele voltou à fila de espera e, pouco depois, se tornou o primeiro paciente a receber um retransplante cardíaco no estado.
“Agora tô com esse [coração de 2005] esse tempo todinho, graças a Deus. Nunca mais deu mais problema”, conta o marceneiro ao g1. Hoje com 60 anos, Antônio continua a trabalhar na sua área, com atividades mais leves, porém sem pausa. Ele faz acompanhamento médico regular no hospital e gosta de manter a assiduidade para ver como anda o coração.
Antes de fazer o transplante em 1999, Antônio já tinha dois filhos. Desde que realizou o primeiro procedimento, ele teve outros três, a quem chama de “filhos do transplante”. Os três, Juan, David e Isis Juliana, de 20, 13 e 3 anos, respectivamente, receberam os nomes em homenagem aos médicos que realizaram o procedimento cirúrgico.
“Vivo na paz. Minha família cresceu, meus filhos cresceram. Já tão estudando, já tão trabalhando, tão me ajudando, eu só tenho a agradecer”, afirma.
Primeiro transplante veio após acidente de carro
A vida de Antônio Pereira mudou em 1998, aos 35 anos após o marceneiro sofrer um acidente de carro na CE-040. “Cochilei no volante e quando acordei, já estava no hospital”, relembra. No período após o acidente, foi identificado que o impacto havia lesionado o coração de Antônio, que passou a apresentar miocardiopatia esquêmica, que levou a um quadro de insuficiência cardíaca.
“Ele não tava conseguindo fazer atividades físicas como caminhar ou se alimentar, tudo dava exaustão”, relata Efigênia Maria, esposa de Antônio. Os dois se conheceram em 2001, dois anos após o primeiro transplante do marceneiro, e estão juntos desde então. Efigênia é mãe dos últimos três filhos de Antônio, os “filhos do transplante”.
À época do primeiro transplante de Antônio, o Ceará já havia dado alguns passos para estabelecer o procedimento na rede pública. Em 1993, um paciente em uma rede privada realizou o primeiro transplante cardíaco da história do estado. O transplantado, João Batista Oliveira, no entanto, acabou falecendo cerca de 90 dias após a cirurgia.
Em 1997, os médicos João David de Souza e Juan Mejia, ambos do hospital público Dr. Carlos Alberto Studart Gomes, popularmente conhecido como hospital da Messejana, realizaram transplantes de pacientes deste hospital em uma unidade hospitalar privada, que tinha estrutura para o procedimento.
Em 4 de janeiro de 1999, quando Antônio Pereira foi à mesa de cirurgia, foi a primeira vez que um paciente do hospital da Messejana seria operado pela equipe do hospital dentro da própria unidade. Hoje, a unidade é o segundo maior centro de transplantes cardíacos do Brasil, ficando atrás apenas do Instituto do Coração, em São Paulo.
Antônio Pereira sofreu acidente há 20 anos e já recebeu dois novos corações — Foto: TV Verdes Mares/Reprodução
O susto do segundo transplante e o novo recomeço
Anos após o primeiro transplante, os sintomas de cansaço voltaram. Antônio voltou ao hospital da Messejana, onde os médicos tentaram salvar o segundo coração de sua vida por meio de uma cirurgia na válvula mitral. Ele precisou colocar um marcapasso, mas, ainda assim, a equipe médica viu que não seria suficiente.
Quando soube que Antônio precisaria ser transplantado novamente, a família ficou receosa de submetê-lo a uma segunda cirurgia do tipo.
“A família tinha medo do segundo transplante porque já tinha passado esse procedimento todinho e passar de novo? Era um susto grande”, relembra o marceneiro. “Todo mundo se afligiu aqui em casa, mas eu queria era viver, eu tinha muita graça no coração”.
Antônio voltou para a fila de espera de transplantes. Em 30 de setembro de 2005, ele passou por uma nova cirurgia, desta vez para receber aquele que é o seu terceiro coração.
Hoje, o homem de 60 anos vive “bem demais, graças a Deus”. Vai regularmente ao médico, continua a trabalhar, apesar de aposentado, e ajuda na criação dos filhos, entre eles a mais nova, Isis Juliana, que assim como Juan e David, tem no nome uma homenagem aos médicos que lhe atenderam.
Para Efigênia, o caso do seu marido é um exemplo de como os transplantes podem ajudar a prolongar e multiplicar vidas.
“Ele recebeu um coração, mas através do coração foram geradas outras vidas, veio outra geração, são mais três filhos, mais três vidas, que dessas três vidas cada um vai ter seus filhos futuramente e vai se multiplicando, isso por meio da doação, da generosidade”, diz Efigênia.