A batalha pela presidência da Turquia parece destinada a um segundo turno, com os dois candidatos inflexíveis sobre quem está com a vitória nas mãos.
Após 20 anos no poder, Recep Tayyip Erdogan discursou da mesma sacada da sede de seu partido onde comemorou as vitórias anteriores e disse estar convencido de que ganharia mais cinco anos no cargo.
Tudo parecia indicar a vitória de seu oponente, Kemal Kilicdaroglu. Mas os resultados parciais da eleição realizada no domingo (14) o colocaram atrás do atual presidente no primeiro turno.
A aliança de Erdogan também parece estar caminhando para a maioria no Parlamento.
Durante meses, os diferentes partidos de oposição da Turquia reuniram recursos, em uma tentativa de acabar com um presidente que ampliou o poder dramaticamente desde um golpe fracassado contra ele em 2016.
A eleição está sendo acompanhada de perto no exterior, porque Kilicdaroglu prometeu reviver a democracia turca, bem como as relações com seus aliados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).
Por outro lado, o governo de raízes islâmicas do presidente Erdogan acusou agentes estrangeiros de conspirar para derrubá-lo.
Nas primeiras horas da segunda-feira (15), Kilicdaroglu estava em um palco na sede de seu partido em Ancara, ladeado por seus aliados, fazendo o possível para parecer otimista.
“Se nossa nação decidiu por um segundo turno, com certeza venceremos no segundo turno”, disse.
Do lado de fora da sede do partido, apoiadores entoavam um dos slogans da campanha — “tudo ficará bem” —, mas não estava claro para eles se isso aconteceria de fato.
Anteriormente, Kilicdaroglu havia acusado furiosamente o governo de tentar “bloquear a vontade do povo”, lançando repetidos pedidos de recontagem e checagem de votos nos redutos da oposição.
Duas estrelas em ascensão do partido, os prefeitos de Istambul e Ancara lembraram aos eleitores que essa era uma estratégia que o Partido AK de Erdogan já havia usado antes. Eles elogiaram a enorme equipe de voluntários da oposição que guardavam as cédulas de votação para garantir que nada de estranho acontecesse com os votos.
Kilicdaroglu, de 74 anos, perdeu várias eleições como líder do Partido Popular Republicano, mas, desta vez, a mensagem de acabar com os poderes excessivos do atual presidente encontrou ressonância na sociedade.
Os turcos também vêm se recuperando de uma crise de custo de vida com inflação de 44%, agravada pelas políticas econômicas pouco ortodoxas de Erdogan.
O governo do atual presidente também foi responsabilizado por uma lenta resposta de resgate aos terremotos duplos ocorridos em fevereiro, que mataram mais de 50 mil pessoas em 11 províncias do país.
E mesmo assim, apesar de alguns meses muito difíceis, Erdogan parece preservar uma vantagem.
Dirigindo-se aos adeptos da mesma varanda que utilizou nas vitórias anteriores, ele declarou que, “apesar do resultado final não ter chegado, estamos muito à frente”.
Quer ele assuma ou não a liderança no segundo turno daqui a duas semanas, o atual presidente parece ter desafiado muitos especialistas e institutos de pesquisa, que apontaram uma vantagem do rival e afirmaram que ele poderia até vencer na primeira rodada das eleições.
Erdogan também pode estar próximo de uma maioria no Parlamento, junto com o aliado partido nacionalista MHP, de acordo com resultados ainda não confirmados que foram compartilhados pela agência de notícias estatal Anadolu.
Os partidários do atual presidente ridicularizaram os aliados da oposição, primeiro por declararem que Kilicdaroglu se tornaria o 13º presidente turco e, depois, por diminuírem gradualmente as expectativas à medida que a noite avançava.
O que esse resultado confirma é o quanto a sociedade turca se tornou polarizada, cem anos desde a fundação desta república.
Nas horas que antecederam o início da votação, Kilicdaroglu encerrou a campanha com uma viagem ao mausoléu de Kemal Ataturk (o primeiro presidente da Turquia), em Ancara. Já Erdogan escolheu fazer uma declaração muito simbólica para a sua base de apoio conservadora e nacionalista, na mesquita Hagia Sophia, em Istambul.
O ex-presidente Ataturk converteu a antiga basílica cristã ortodoxa em um museu — mas, em 2020, Erdogan a transformou novamente em uma mesquita.
Não está claro o quão apertado será o segundo turno e já há muita especulação sobre o que acontecerá com os 5% de votos que foram destinados para o terceiro colocado nas eleições — o ultranacionalista Sinan Ogan.
Ogan sabe que os dois líderes das eleições tentarão cortejá-lo — e deve estabelecer algumas condições difíceis para dar o apoio.
Ainda assim, é impossível cravar que, mesmo com o empenho do terceiro colocado, os votos dele irão automaticamente para Erdogan ou Kilicdaroglu.
Fonte: BBC