A morte de David Dias, de 12 anos, após ter paradas cardíacas devido a efeitos provocados pelo uso da “supermaconha”, acende um alerta para os riscos causados pela droga sintética.
De acordo com especialistas ouvidos pelo R7, o entorpecente — também conhecido como k2, k9, Spice, Space, Zen, Crazy Monkey — pode causar alucinações e convulões severas.
Na periferia de Diadema, em São Paulo, Kelly Santos, mãe de David, contou que, desde dezembro, fumar maconha sintética se tornou um hábito cada vez mais comum entre as crianças e os adolescentes do bairro.
Mesmo após a morte do menino, o índice de usuários nessa faixa etária ainda é grande. “O uso de drogas entre as crianças não para. Em todo lugar que eu ando ainda vejo crianças usando”, relatou a mulher.
Wélissa Moura, psiquiatra do Caps (Centros de Atenção Psicossocial), alerta que os riscos de usar drogas se tornam ainda mais graves em crianças. “Esses entorpecentes ocasionam maior potencial de toxicidade neuropsiquiátrica e risco de morte, com consequências devastadoras em crianças e adolescentes, visto que, nessa faixa etária, esta população ainda se encontra em processo de amadurecimento de estruturas cerebrais e redes neurais”, explicou.
Maconha sintética
Diferentemente da maconha orgânica, que é a planta Cannabis em sua forma natural, a maconha sintética é um composto químico semelhante aos derivados da planta, porém produzidos em laboratório e com efeitos muito mais potentes no organismo.
Esses compostos são feitos com grandes quantidades de THC (Tetrahidrocanabinol), a principal substância psicoativa encontrada nas plantas do gênero Cannabis. “O objetivo inicial para o desenvolvimento das variações era entender a ação da molécula no organismo, porém, hoje são utilizados para fins ilícitos”, explica a especialista em farmacologia e mestre em farmácia Maéli Civa.
A especialista ainda explica que compostos que não são totalmente conhecidos acabam sendo misturados com plantas alucinógenas e outras drogas sintéticas, como êxtase. Assim, os efeitos são muito potentes e duradouros, e podem ter sentido duplo em diferentes organismos. “Para as crianças, o entorpecente fica muito mais forte e causa danos alarmantes”, apontou Maéli.
Efeitos da “supermaconha”
David Dias morreu após ter tido paradas cardíacas devido ao uso da “supermaconha”. A farmacêutica diz que o THC presente na droga apresenta efeitos duplos: “Algumas pessoas podem ter quadros de euforia, alucinações e paranoias com alteração de consciência, e outras podem ter sonolência, tontura, relaxamento muscular, ansiedade e convulsões severas”.
Kelly se lembrou do dia em que descobriu que o menino estava usando o entorpecente. “Ele chegou em casa sonolento e eu percebi que ele estava do mesmo jeito que pessoas que usam a K2 ficam. Eu perguntei se ele tinha feito o uso da droga e ele disse: ‘Não, mãe, eu não fiz. Eu estava só com sono”, e eu falei: ‘Não, sono não é assim'”, contou.
Depois de ter tomado banho e se alimentado, David “despertou e ficou tranquilo”. Dias depois, o menino parecia agir normalmente. “De lá pra cá não percebi mais nada, até essa última vez que ele teve parada cardíaca e morreu por causa da K2”, acrescentou.
A dependência provocada pelos compostos do THC sintético está relacionada com os receptores cerebrais que, por serem mais sensíveis em crianças, recebem estímulos mais potentes. “Esses efeitos danificam o sistema cerebral e desencadeiam convulsões extremamente severas, o que pode levar os usuários ao óbito, como aconteceu com o menino de 12 anos”, explicou Maéli.
De acordo com especialistas entrevistados pela Record TV, a supermaconha é considerada o crack do futuro.
Cannabis medicinal
A farmacêutica alerta para a diferença entre derivados da Cannabis para uso recreativo e para uso medicinal. Quando usada da maneira correta, os compostos ajudam no tratamento de alguns pacientes que lidam com falta de apetite, dores no corpo e até no controle de quadros de convulsões, pois eles agem nos receptores cerebrais e modulam a excitabilidade dos neurônios.
“Os derivados da Cannabis já estão sendo usados como medicação com estudos e registros legalizados. No medicamento a gente consegue controlar a dose, mas a droga é feita de qualquer jeito”, alertou.
Apoio à crianças viciadas
A Prefeitura de São Paulo, por meio da SMS (Secretaria Municipal da Saúde), disponibiliza 470 UBSs (Unidades Básicas de Saúde) e os Caps da capital como portas de entrada para o cuidado em saúde mental, sendo os Caps Álcool e Drogas e os Caps Infantojuvenil referências no atendimento de pessoas com problemas relacionados ao uso de substâncias psicoativas em suas respectivas faixas etárias.
De acordo com a SMS, em 2022 foram realizados mais de 1.950.000 procedimentos nas unidades Caps. O serviço de saúde é de caráter aberto e comunitário, formado por uma equipe multidisciplinar composta por médicos psiquiatras, psicólogos, enfermeiros, farmacêuticos, assistentes sociais, educadores físicos e outros profissionais que avaliam o quadro clínico de cada paciente e indicam o tratamento adequado. Os casos tratados são previamente agendados e espontâneos.
“A fim de evitar a dependência química, os Caps atuam com foco na informação sobre riscos e consequências, prevenção e tratamento de comorbidades psiquiátricas e suporte social adequado”, explicou a SMS.
Fonte: R7