O médico Draurio Barreira assume a direção do Departamento de Vigilância de IST/Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde buscando diminuir ou até eliminar doenças transmissíveis que ainda representam uma grave ameaça à saúde pública, como a tuberculose e a Aids.
Para isso, segundo ele, é preciso oferecer e ampliar o acesso a novas tecnologias para prevenção e diagnóstico no Sistema Único de Saúde (SUS), além da reabertura do diálogo com a sociedade.
“Eu acredito na possibilidade da eliminação dessas doenças, como a sífilis congênita, a tuberculose e até da Aids como problema de saúde pública”, disse.
“No caso da Aids, é um pouco mais complexo, e aí a gente não pode desprezar a participação da sociedade civil nessa resposta nacional, que não inclui só o Ministério da Saúde, mas também outros setores do governo federal, as secretarias estaduais, municipais e o sistema privado”, afirmou Barreira em entrevista ao g1.
Vale notar que:
- Eliminar é diferente de erradicar;
- Quando uma doença é eliminada, a taxa de infecção chega a quase zero ou zero. Ainda requer vigilância, mas não é considerado mais um problema de saúde pública;
- Quando uma doença é erradicada, significa a ausência total da possibilidade de transmissão, como é o caso da poliomielite no Brasil, freada por conta da vacinação.
- A meta global aprovada pelos estados-membros da ONU e liderada pelo UNAIDS para a eliminação da Aids como ameaça à saúde pública é até 2030.
Perfil do novo diretor
Servidor do Ministério da Saúde desde 1995, Barreira foi nomeado diretor do órgão na semana passada. O médico trabalha com os temas ligados ao HIV/Aids e tuberculose há pelo menos 30 anos. Até então, era gerente da tuberculose na Unitaid, agência global ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS), em Genebra, na Suíça.
Draurio Barreira é o novo diretor do Departamento de Vigilância de IST/Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde — Foto: Arquivo Pessoal/Divulgação
Aceitou o desafio de retornar ao Brasil e chefiar um departamento que sofreu um desmonte na gestão de Jair Bolsonaro (PL), principalmente na questão financeira – no último ano, o corte foi de 60%.
Segundo Barreira, o orçamento atual da Saúde não é suficiente para os planos de eliminação dessas e de outras doenças. Mas há promessa de recomposição dos valores.
“Uma das prioridades é buscar novas fontes de recursos. Vamos buscar diálogo parlamentar e também com outros ministérios, transcender os limites do Ministério da Saúde”, explicou.
Autotestagem para HIV
O novo diretor da Saúde quer ampliar o diagnóstico do HIV, com foco no autoteste e na descentralização do diagnóstico, hoje feito apenas por médicos.
Autotestes para HIV não são novidade no Brasil: são vendidos em farmácias e, no SUS, existem dois tipos, distribuídos principalmente para pares e parcerias sexuais de pessoas vivendo com HIV ou pessoas mais vulneráveis a infecções;
Mas o teste rápido não dá o diagnóstico. Um resultado positivo pode indicar que a pessoa esteja infectada pelo HIV, mas o diagnóstico definitivo é dado apenas por médicos, com base também em outros exames.
Barreira defende que a autotestagem para HIV seja mais acessível e universal, com a possibilidade de que outros profissionais ou até que as próprias pessoas façam o diagnóstico.
“A gente pode ter um diagnóstico desse e outros agravos que não seja por um profissional médico? É uma discussão necessária”, explicou.
A estimativa de 2021 do Ministério da Saúde mostrou que 960 mil pessoas estão vivendo com HIV no Brasil. No mesmo ano, foram detectados 40,8 mil casos de HIV e 35,2 mil casos de Aids – cerca de 727 mil pessoas estão em tratamento.
O médico ainda quer reabrir o diálogo com as comunidades mais afetadas pelo HIV e outras ISTs, pois, segundo ele, ” no último governo, essa escuta acabou”.
“A primeira coisa que eu quero fazer é ouvir o que as pessoas querem, todas as pessoas afetadas por essas doenças. Como recriar, reestabelecer, e fortalecer as instancias de controle social e participação social dentro da gestão? É o primeiro ponto a ser discutido”, disse Draurio Barreira.
Redução da tuberculose
A tuberculose é uma das doenças infecciosas que mais mata no mundo – em 2020, ficou atrás apenas da Covid-19. Apesar de ser evitável e curável, no Brasil são registrados aproximadamente 70 mil casos novos da doença por ano e cerca de 4,5 mil mortes – em 2021, a taxa de incidência foi de 32 casos por 100 mil habitantes.
A meta nacional é reduzir para menos de 10 casos por 100 mil habitantes e o número de óbitos pela doença para menos de 230 ao ano – até 2035.
“Não estamos longe. Se você olhar em determinados lugares, são 800 até mil casos por 10 mil habitantes”, disse o novo diretor do Ministério da Saúde.
“Se você não detectar todo mundo que tem e evitar a transmissão, você não acaba com essa doença. Eu pessoalmente acho que a gente consegue fazer isso no Brasil. Atacando a questão do desenvolvimento social e a inovação no diagnóstico, na prevenção e no tratamento, eu realmente acredito”, afirmou Barreira, que busca antecipar a conclusão da meta para até 2030.
Campanha de combate à tuberculose em Ferraz de Vasconcelos (SP) — Foto: Jonathan Andrade/Secom Ferraz
Para Barreira, é necessário ampliar o acesso a novos métodos de prevenção para tuberculose e elaborar programas para as populações mais vulneráveis. “Isso vai evitar que essas pessoas morram e que essas pessoas transmitam o vírus”, afirmou o médico.
Outro desafio da gestão de Barreira será aumentar a oferta das vacinas contra a tuberculose (BCG) e contra a hepatite B, ambas aplicadas nos primeiros meses de vida e que estão com baixos estoques nos municípios desde o ano passado.