BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) — Após o governo Jair Bolsonaro (PL) bloquear R$ 2,4 bilhões no orçamento do MEC (Ministério da Educação), que atinge instituições federais de ensino, o ministro da Educação, Victor Godoy Veiga, convocou uma entrevista nesta quinta-feira (6) para minimizar a decisão, negar que tenha havido cortes, além de dizer que as queixas de universidades e institutos têm motivação política.
O bloqueio foi anunciado nesta quarta (5) em ofício enviado para as federais, que criticaram a medida por temer pela continuidade dos serviços ao longo deste ano. Já no dia anterior o MEC fez estorno de valores dos caixas das instituições.
“Lamento ver algumas instituições que têm utilizado isso de maneira política”, disse o ministro, argumentando que o bloqueio não significa retirada definitiva do recurso previsto. “Não há corte, não há bloqueio, não há [risco de] paralisação [das atividades].”
Os R$ 2,4 bilhões representam 11,4% da dotação atual de despesas discricionárias do ministério. São as despesas de livre movimentação, sem levar em conta salários e transferências obrigatórias, por exemplo, mas imprescindíveis para pagamentos de contas como água, luz, segurança e assistência estudantil.
Trata-se de uma limitação imposta pela área econômica do governo Bolsonaro nos limites de movimentação e empenho das pastas — a mais afetada, mais uma vez, foi a Educação. Na prática, o uso do dinheiro previsto no orçamento fica temporariamente congelado.
O ministro não respondeu, durante a entrevista, por que a Educação tem sido a mais prejudicada durante o governo Bolsonaro quando há decisões de cortes e congelamentos.
O governo insiste que haverá a liberação em dezembro dos recursos agora bloqueados. Reitores temem, no entanto, que isso não ocorra e argumentam que a limitação atual pode inviabilizar a continuidade das atividades.
Para as instituições federais de ensino, a redução foi 5,8%. Segundo divulgado por reitores, isso pode paralisar o funcionamento de unidades.
Os institutos federais de educação técnica acumulam perda de R$ 300 milhões no ano. Nas universidades, os congelamentos perfazem uma retirada de R$ 763 milhões com relação ao que havia sido aprovado no orçamento deste ano.
O corte desta semana, que se soma a enxugamentos sistemáticos de dinheiro da educação desde 2019, tem causado desgaste ao governo às vésperas do segundo turno da eleição entre Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A Andifes, que representa os reitores das universidades federais, divulgou nota afirmando que a limitação “esgota as possibilidades de pagamentos a partir de agora” e é insustentável. “Lamentamos também que seja a área da educação, mais uma vez, a mais afetada pelos cortes ocorridos”, diz a Andifes.
O Conif, conselho que agrega os institutos técnicos, divulgou posicionamento em que aponta o estudante como o maior prejudicado, “pois os recursos da assistência estudantil são fundamentais para a sua permanência na instituição”.
Na entrevista, Godoy disse que, “quando vem uma manifestação política de uma associação que quer dizer que vai paralisar o ensino superior”, a pasta teria a informação qualificada de cada instituição e sabe qual pode precisar de mais recursos. Se for necessário, disse ele, o MEC promete analisar casos específicos para garantir liberações extras de movimentação.
Além de acusar instituições de agir politicamente, o ministro fez menção à eleição. “É um uso político dessa informação, inclusive distorcida”, diz ele, “em um momento muito importante para o país. Precisamos deixar que as pessoas façam suas escolhas baseadas em informações fidedignas”.
Maior federal do país, a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) divulgou nota em que afirma que o impacto desse bloqueio, de R$ 18 milhões na instituição, somado aos anteriores, deixa a instituição com o menor orçamento discricionário dos últimos dez anos.
“Se o bloqueio não for revertido, provavelmente não teremos como continuar funcionando neste ano”, declarou, por nota, o pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças da UFRJ, Eduardo Raupp.
Um decreto publicado pelo governo no dia 30 de setembro definiu os limites de movimentação de empenho do MEC e de outros ministérios. O ofício que chegou na quarta às federais sacramenta o conteúdo do decreto.
Tanto o MEC quanto o Ministério da Economia têm insistido que o bloqueio atual não significa corte por se tratar de uma limitação na movimentação, com chance de ser liberado em dezembro. Os valores bloqueados seriam para o cumprimento do teto de gastos.
O valor cortado do MEC, sem previsão de ser reposto, chega a R$ 1,04 bilhão.
“Cabe ao MEC avaliar suas dotações orçamentárias e, caso necessário, propor remanejamento de bloqueios entre elas visando a redução do impacto desses bloqueios nas políticas públicas a cargo do Ministério”, diz nota da Economia.
O MEC argumentou que, na média, as instituições federais de ensino têm recursos disponíveis porque nem todo orçamento foi empenhado e pago. Nas universidades, 84,9% das despesas discricionárias foram empenhadas e 50,1% dessas despesas, pagas, diz a pasta. Já os institutos federais empenharam 82,6% e pagaram 44,9% do orçamento do corrente ano.
A área da educação sofre cortes generalizados sob o governo Bolsonaro. O jornal Folha de S.Paulo mostrou em setembro que os gastos com construção de creches caem fortemente, ano a ano, desde 2019.
O MEC terminou 2021 com R$ 101 milhões pagos para obras de creches em prefeituras. Trata-se de uma redução de 80% com relação a 2018, quando a cifra foi de R$ 495 milhões, em valores atualizados a preços de 2021.
No orçamento de 2023, a previsão é da retirada de R$ 1 bilhão da educação básica. O cenário negativo para a educação infantil se intensifica: os recursos previstos para a etapa caem 96% com relação ao projeto deste ano. Passa de R$ 151 milhões para apenas R$ 5 milhões, como ressalta análise do Movimento Todos Pela Educação.