O encontro de um espécime vivo da jiboia-do-ribeira em um cativeiro em Sete Barras, no interior de São Paulo, representa uma vitória para especialistas em cobras no Brasil. Analista ambiental, Carlos Roberto Abrahão explicou ao g1 neste sábado (26) que este é apenas o terceiro espécime encontrado vivo desde 2017, e que a serpente, da espécie Corallus cropanii, é considerada uma das mais raras do mundo.
Em 2017, após 60 anos de procura, pesquisadores do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo e do Instituto Butantan encontraram, também no Vale do Ribeira, um exemplar macho da jiboia-do-ribeira. Em 2020, outro espécime foi achado “sem querer” em Sete Barras. A cobra encontrada nesta quinta-feira (24) é um macho adulto, que, de acordo com o ICMBio, aparenta estar em boas condições. Ela estava em um cativeiro na casa de um homem no bairro Guapiruvu.
O local foi descoberto depois de uma denúncia de vigilantes do Parque Estadual Intervales (PEI). Os profissionais observaram um movimento suspeito de um homem saindo da mata, na Área de Preservação Ambiental (APA) da Serra do Mar. Após investigação, a equipe de fiscalização da Fundação Florestal encontrou a cobra em uma caixa, na residência do suspeito. O animal foi resgatado, a Polícia Militar Ambiental foi acionada e multou o homem em R$ 10 mil.
“Ela não era uma espécie totalmente ausente, mas a gente não tinha tido contato com um indivíduo vivo. Desde a sua descrição, na década de 1960, ela foi considerada uma espécie realmente bastante rara”, diz Carlos, que também é médico veterinário do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Répteis e Anfíbios (RAN), ligado ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), e coordena o plano de ação nacional para conservação de répteis ameaçados da Mata Atlântica da região Sudeste.
Apesar de a coloração dela saltar aos olhos, Carlos diz que esta é uma espécie muito difícil de enxergar. O monitoramento dela só é possível porque os biólogos usam um rádio transmissor, já que ela se camufla na copa das árvores. Atualmente, a classificação dessa jiboia na União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) é a de espécie em perigo de extinção. Esta é uma categoria antes da máxima, antes de ser considerada extinta, a “crítica em perigo”.
“A partir de 2009, nós, no RAN, iniciamos um trabalho de pesquisa na região do Vale do Ribeira, para tentar reencontrar esse bicho vivo. Encontrar um [espécime] vivo é, para a gente, uma grande vitória, principalmente porque a gente tem trabalhado na região com a instrução da comunidade. Para que eles entendam a importância dessa espécie, que eles saibam reconhecer e a importância de mantê-la viva”, explica.
Segundo a Fundação Florestal, retirar cobra do habitat natural pode contribuir para a extinção da espécie — Foto: Divulgação/Polícia Ambiental
Tráfico
Carlos afirma, no entanto, que a valorização da espécie trouxe um problema. “Aparentemente, esse caso foi o oposto do que a gente quer. Um problema decorrente do conhecimento dessa espécie é que a possibilidade de captura para o tráfico desses animais aumenta. É um animal bastante raro, que gera interesse no comércio”, conta.
“Não se sabe se este caso foi uma tentativa de tráfico. A polícia tem que apurar os fatos, primeiro. Mas, se for, pode indicar um problema. E, de qualquer forma, só o fato de capturar esse animal na natureza já caracteriza crime ambiental. Essa espécie está sendo monitorada de perto. E o poder público está pronto para agir a qualquer sinal de tráfico”, afirma.
Jiboias
O diretor do Museu Biológico do Instituto Butantan, Giuseppe Puorto, explica que a jiboia-do-ribeira não é venenosa, e possui apenas dez exemplares conhecidos no mundo. Ela pode alcançar 2 metros de comprimento, e é um animal “arborícola, ou seja, vive nos estratos superiores das árvores”, diz.
“Ela tem hábitos noturnos e se alimenta, provavelmente, de roedores. Tem um comportamento peculiar, e sua rotina ainda está sendo estudada”, completa Giuseppe.
Os especialistas alertam para a importância de não encostar nas serpentes, mesmo na jiboia, que não é peçonhenta, ou seja, não é venenosa. “Se você não conhece, não pega. A grande maioria dos acidentes acontece quando a pessoa vai tentar manusear o bicho erroneamente”, diz Carlos.
Cobra era mantida em cativeiro dentro de casa no interior de SP — Foto: Divulgação/Polícia Ambiental