Apoiado politicamente por China, Turquia e Rússia, o presidente do Cazaquistão Kassym-Jomart Tokayev rejeitou a ideia de iniciar conversações com os revoltosos, tendo inclusive dado ordens de “atirar para matar”. Os Estados Unidos, que na véspera advertiram o regime autoritário em relação ao uso da força, desta vez lembraram que “por vezes é muito difícil fazê-los sair”, em referência às tropas russas chegadas ao país da Ásia central na sequência de um pedido de Tokayev.
Há pouco mais de dez anos, uma greve de trabalhadores da indústria petrolífera por melhores condições de trabalho, na cidade de Zhanaozen, foi declarada ilegal e mil pessoas foram despedidas. Dos protestos que daí resultaram, a polícia matou pelo menos 15 manifestantes. Foi na mesma cidade que eclodiu na semana passada o movimento contra o aumento do preço do GPL, gás produzido e exportado pelo Cazaquistão, e que devido ao seu preço mais baixo passou também a ser consumido em carros convertidos pelos automobilistas cazaques.
O aumento do preço dos combustíveis num país de abundantes recursos, mas cuja riqueza permanece na mão de poucos foi o rastilho. Nursultan Nazarbayev, líder do país desde a sua independência, cedeu a presidência em 2019 ao então líder do Senado Tokayev, quando omovimento pelos direitos humanos e democracia se fazia ouvir cada vez mais alto, mas a sua passagem para presidente do Conselho de Segurança demonstrou que a mudança era cosmética. Os manifestantes derrubaram uma estátua do ex-presidente e tinham como palavra de ordem “Shal ket!” (Velho, fora!).
200 O valor do subsídio aos combustíveis é de 200 euros per capita por ano, ou 2,6% do PIB do Cazaquistão. No total do planeta, a OCDE estima que os governos gastaram 330 mil milhões de euros em subsídios aos combustíveis fósseis em 2020.
Perante os protestos, que de forma rápida se espalharam a uma dúzia de cidades, em especial a maior, Almaty, o presidente Tokayev dirigiu-se três vezes à população e acabou por, a meio, mudar de rumo. Primeiro procurou acalmar as massas, ao anunciar o despedimento de todo o governo e o afastamento de Nazarbayev, ficando com as rédeas da segurança e da defesa. Depois, no final do mesmo dia, quarta-feira, descreveu os manifestantes como “terroristas” e ato contínuo apelou para a solidariedade da aliança militar liderada pela Rússia, a Organização do Tratado de Segurança Coletiva (OTSC), composta por seis ex-países da URSS.
CAZAQUISTÃO
Na sexta-feira, o Ministério da Defesa da Rússia disse que paraquedistas expedidos em nove aviões tinham aterrado em Almaty e ajudado a proteger o aeroporto. Segundo o porta-voz de Vladimir Putin, o presidente russo e o congénere cazaque têm falado diversas vezes sobre a situação no país, bem como a missão da OTSC, da qual se desconhecem ainda os detalhes.
O secretário de Estado norte-americano Antony Blinken, que falou com o homólogo cazaque, pediu respeito pelos protestos pacíficos e avisou Nursultan: “Uma lição da história recente é que, assim que os russos estão na sua casa, é por vezes muito difícil fazê-los sair.”