CAMPO GRANDE, MS (FOLHAPRESS) — O governador de Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), sancionou uma lei que proíbe o uso da linguagem neutra nas escolas e nos documentos oficiais. Depois de Rondônia, é o segundo estado a adotar essa medida, que se transformou em uma bandeira do bolsonarismo.
“É obrigatória a utilização da norma culta da língua portuguesa nos instrumentos de aprendizagem utilizados no ambiente escolar, nos documentos oficiais e na confecção de materiais didáticos, como forma de padronização do idioma oficial do país”, diz a lei 5.820, publicada em 29 de dezembro.
O projeto que deu origem à lei é autoria do deputado estadual ruralista Marcio Fernandes (MDB) e foi aprovado na Assembleia Legislativa por 14 votos a 1.
“Surgiriam dificuldades graves na transmissão dessa inovação, especialmente a adultos e idosos, que já estão adaptados ao vernáculo, a gerar mais exclusão do que inclusão (sic)”, escreveu Fernandes, ao apresentar o projeto. “Na língua de uma nação, nada se acresce pelo uso da força ou do enviesamento político-ideológico.”
Único deputado a votar contra a lei, o ex-secretário de Educação Pedro Kemp (PT) citou dois motivos. “Primeiro, porque, no meu entendimento, a Assembleia não tem competência para legislar sobre o uso da língua portuguesa.”
“Segundo, porque a língua é viva, sofrendo mudanças ao longo do tempo, com a inclusão de novos vocábulos, alterando o sentido de outros, incluindo regionalismos, além de termos e expressões estrangeiras. Quem faz a língua é o povo que a fala. Não é possível proibir por lei que as pessoas se expressem como desejam”, completou.
Procurado pela reportagem, o governo Azambuja enviou o parecer da consultoria legislativa para justificar a sanção da lei.
De acordo com esse parecer, a nova norma “apenas dispõe sobre a obrigatoriedade de utilização da norma culta da língua portuguesa nos instrumentos de aprendizagem utilizados no ambiente escolar, nos documentos oficiais e na confecção de materiais didáticos, como forma de padronização do idioma oficial do país, ressalvando as hipóteses de utilização da língua indígena no ambiente escolar”.
Ao todo, tramitam pelas Assembleias Legislativas 34 propostas que visam proibir fórmulas para substantivos, adjetivos e pronomes que contemplem pessoas não binárias, que não se identificam com os gêneros masculino e feminino. O levantamento foi feito pela agência Diadorim, em outubro.
Em novembro, o ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), suspendeu a lei de Rondônia que veta o uso de linguagem neutra nas escolas do estado, dentro de uma ação movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino.
Para o magistrado, a legislação “ofende materialmente a Constituição”. Ele afirmou que a linguagem neutra “visa combater preconceitos linguísticos, retirando vieses que usualmente subordinam um gênero em relação a outro”.
Fachin afirmou que “é difícil imaginar” que proibir a linguagem neutra seja compatível com a liberdade de expressão.
No governo federal, o secretário de Fomento e Incentivo à Cultura, o capitão da PM André Porciuncula, publicou em outubro uma portaria vetando o uso e a apologia da linguagem neutra em projetos financiados pela Lei Rouanet.