O salário mínimo de 2022 deve ser de R$ 1.169, segundo proposta orçamentária anunciada pelo governo federal nesta terça-feira (31). O reajuste de R$ 69 (6,27%) é inferior à inflação projetada para o ano, que é de 7,46%.
E bem distante do necessário para garantir a sobrevivência da família brasileira com dignidade, que seria de R$ 5,4 mil, segundo a economista Patrícia Costa, supervisora de pesquisas do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos).
Para ela, o novo piso nacional, se aprovado, ampliará a diferença entre o piso real, no caso R$ 1.100 em vigor e de R$ 1.169 (previsto para o ano que vem) e o necessário para a sobrevivência do brasileiro “com dignidade respeitando os preceitos da Constituição Federal”.
Para chegar ao piso salarial necessário, o Dieese considera a cesta básica mais cara de 17 capitais e as necessidades básicas de uma família com dois adultos e duas crianças, conforma estabelece a Constituição Federal.
Entre elas, alimentação, educação, moradia, saúde e transporte.
A desvalorização do salário mínimo vem ocorrendo ano a ano. Porém, desde 2019, o piso nacional passou a ser corrigido apenas pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), a fim de preservação do poder de compra do mínimo.
A decisão, no entanto, não traz ganho real à remuneração dos profissionais. Com a correção sendo feita apenas pela inflação, o salário mínimo fica cada vez mais distante do valor necessário para a sobrevivência das famílias.
Situação do país é triste e crítica, aponta economista
Patrícia fala que as políticas sociais adotadas pelo governo – auxílio emergencial, vale gás, entre outros – amenizam a situação crítica que vivem muitas famílias de forma momentânea.
“Uma política social boa torna o cidadão apto para exercer um trabalho digno e com remuneração suficiente participar consumir junto com toda a sociedade”, diz.
A pesquisadora lembra que para as famílias de baixa renda a maior parte da sua remuneração é direcionada à alimentação, que vem ficando cada vez mais cara no nosso país.
No ano passado, os alimentos subiram 18% contra uma inflação de 4,5%, segundo André Braz, coordenador do IPC (Índice de Preços ao Consumidor) do FGV-IBRE (Instituto Brasileiro de Economia).
O economista lembra que já há uma defasagem de outros reajustes da remuneração base porque não olharam para o item de maior necessidade dessas famílias: os alimentos.
“São distorções que vão se acumulando gradualmente porque não estamos falando de uma cesta de consumo diversificada. Se as famílias com renda próxima a um salário mínimo pudessem comprar de tudo, eu acredito que a inflação média, que é a utilizada para o cálculo, deixaria tudo no zero a zero”, disse André Braz.
Patrícia lamenta o momento atual e o fato de muitas famílias estarem passando fome e morando nas ruas por não conseguir manter o pagamento do aluguel.
“Soube que a Praça da Sé [na região central da capital de São Paulo, considerada o marco zero do município] está lotada de pessoas morando por lá. A situação da cidade está muito triste”, lamenta a economista.
Para ela a situação mais crítica é a fome enfrentada pela população por causa da elevada inflação que vem atingindo os alimentos.
“É triste saber que os chineses estão comendo nossa melhor carne enquanto aqui há filas imensas de pessoas querendo um osso de boi”, disse Patrícia Costa.
Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apontam alta de 34,3% no valor das carnes. Um dos motivos é o aumento das exportações da proteína animal por causa da valorização do dólar.
Juliana Inhasz, professora de economia do Insper, também fala sobre o impacto do reajuste na vida de uma família que vive com o salário mínimo.
“A inflação está ganhando do salário mínimo. Esse trabalhador que receberá um aumento de R$ 69 receberá menos do que a inflação e vai diminuir o seu poder de compra em relação ao ano passado”, disse Juliana Inhasz.
Ela cita o exemplo de um trabalhador que ganhava R$ 1.100 em janeiro de 2021 e consumia todo esse rendimento, considerando que a maior parte da sua cesta de consumo vai para alimentação.
Ao receber R$ 1.169 a partir de janeiro do ano que vem, ou seja, um aumento de 6,27%, ele terá um reajuste inferior à inflação projetada para o ano, que é de 7,46%.