O Talibã anunciou uma “anistia geral” em todo o Afeganistão nesta terça-feira (17) e pediu às mulheres que se juntem ao seu governo, em uma tentativa de convencer a população (e a comunidade internacional) de que o grupo mudou.
Os extremistas disseram que todos “devem retomar sua vida cotidiana com total confiança” e pediram aos funcionários públicos que voltem a trabalhar normalmente.
O Talibã está tentando se mostrar como mais moderado do que quando comandou o país, entre 1996 e 2001, e adotou uma visão extremamente rigorosa da lei islâmica, impondo restrições sobretudo às mulheres, que eram impedidas de trabalhar e estudar.
Como parte deste esforço, um porta-voz do Talibã foi entrevistado nesta terça por uma apresentadora mulher, sem burca, na rede de televisão Tolo News.
“O mundo inteiro agora reconhece que os talibãs são os verdadeiros governantes do país”, disse Beheshta Arghand à apresentadora Mawlawi Abdulhaq Hemad, segundo o jornal americano “The New York Times”. “Estou surpreso que as pessoas tenham medo do Talibã”.
Mas muitos afegãos (e a comunidade internacional) continuam céticos. Os mais velhos se lembram das visões islâmicas ultraconservadoras que também incluíam apedrejamentos, amputações e execuções públicas.
Enamullah Samangani, membro da comissão cultural do Talibã, afirmou que o novo governo “não quer que as mulheres sejam vítimas”. “Elas deveriam estar na estrutura governamental de acordo com a lei sharia” (sem especificar como a lei islâmica seria interpretada).
Outros líderes talibãs já disseram que não buscarão vingança contra aqueles que trabalharam para o governo afegão ou países estrangeiros. Mas algumas pessoas dizem que os extremistas têm listas de pessoas que cooperaram com o governo e estão procurando por elas em Cabul.
Rupert Colville, porta-voz do alto comissário das Nações Unidas para direitos humanos (Acnur), afirmou em um comunicado que “essas promessas precisarão ser honradas” e que, por enquanto, “foram recebidas com algum ceticismo”.
“Houve muitos avanços duramente conquistados em direitos humanos nas últimas duas décadas. Os direitos de todos os afegãos devem ser defendidos”, disse o porta-voz da Acnur.
Enquanto isso, o governo alemão anunciou a suspensão da ajuda financeira ao Afeganistão, que é uma fonte crucial de financiamento para o país — e os esforços do Talibã para projetar uma versão mais branda pode ter como objetivo garantir que o dinheiro continue sendo enviado.
Volta ao ‘normal’
Em meio aos sinais trocados, afegãos tentam retornar à vida normal em Cabul terça. Muitas lojas reabriram, o tráfego era intenso e as pessoas voltaram às ruas da capital.
Mas alguns ainda têm medo — principalmente as mulheres, que em sua maioria evitam sair às ruas. Talibãs estão organizando o fluxo de veículos e instauraram postos de controle na cidade.
O Talibã voltou ao poder com uma ofensiva relâmpago, conquistando todas as províncias e a capital Cabul em menos de duas semanas. Muitas cidades caíram sem lutar, e o presidente afegão, Ashraf Ghani, fugiu do país.
A tentativa de volta à vida “normal” ocorre um dia após cenas de caos e mortes serem registradas no aeroporto da capital, com milhares de pessoas invadindo a pista para tentar fugir do país.
Em meio ao desespero, afegãos entraram em aviões estacionados e se agarraram a aeronaves prestes a decolar. Vídeos mostram o que seriam pessoas caindo do céu após a decolagem.
Talibã de volta ao poder
Pessoas estão tentando deixar o Afeganistão após o Talibã tomar a capital Cabul e voltar ao poder depois de 20 anos. O presidente afegão fugiu do país, e o palácio presidencial foi tomado no domingo (15).
A queda de Cabul ocorreu muito antes do previsto pelos EUA: os serviços de inteligência americanos estimavam que o Talibã chegaria à capital afegã em setembro, com uma possível tomada do poder em novembro.
O Talibã foi retirado do poder em 2001 pelos EUA, que atacaram o Afeganistão em reação ao atentado do 11 de Setembro. O grupo extremista eram acusado de esconder e financiar membros da Al-Qaeda, grupo terrorista comandado por Osama bin Laden e responsável pela queda das Torres Gêmeas.
Em fevereiro de 2020, o então presidente americano, Donald Trump, assinou acordo de paz com o Talibã que previa a retirada total das tropas do Afeganistão até abril deste ano. O atual presidente dos EUA, Joe Biden, manteve o acordo e adiou a saída completa para o fim deste mês.
A maior parte das forças lideradas pelos EUA deixaram o Afeganistão em julho, e o Talibã se aproveitou da retirada e avançou rapidamente pelo país, conquistando todas as províncias e a capital Cabul em menos de duas semanas.