Medidas adotadas pelo governo federal, pelos estados e pelas capitais para a reabertura das escolas são insuficientes para garantir segurança a alunos, professores e funcionários, de acordo com um grupo de pesquisadores que monitora as políticas de enfrentamento da pandemia.
Ligado à Rede de Pesquisa Solidária, que articula instituições acadêmicas públicas e privadas, o grupo fez análise minuciosa das providências tomadas nas três esferas de governo desde o início do ano e identificou falhas nos protocolos estabelecidos para retomada de aulas presenciais.
Os pesquisadores concluíram que a falta de coordenação entre o governo federal e os que estão na linha de frente do combate ao coronavírus levou muitos governadores e prefeitos a investir em políticas pouco eficazes, em detrimento de medidas que poderiam oferecer maior proteção nas escolas.
O grupo examinou decretos, portarias, comunicados oficiais e outros documentos, atribuiu notas às medidas associadas a oito áreas e criou um Índice de Segurança do Retorno às Aulas Presenciais (ISRAP) para comparar as escolhas dos gestores nas várias unidades da Federação.
O índice varia de 0 a 100. Quanto maior a nota, mais próximas as políticas estão das recomendações da OMS (Organização Mundial da Saúde) e de autoridades sanitárias dos EUA e da Europa. Os pesquisadores não avaliaram a implementação dos protocolos oficiais nem seus resultados.
Na média, as políticas estabelecidas pelo governo federal foram consideradas menos rigorosas do que as dos governos locais, principalmente por não conterem nenhum tipo de orientação para normas de distanciamento nas salas de aula e testagem de alunos e profissionais para rastrear casos de infecção.
Os pesquisadores também criticam protocolos de vários governos locais, por darem ênfase a medidas como aquisição de termômetros e limpeza de superfícies e deixarem em segundo plano outras que contribuiriam mais para deter a Covid-19, como os testes e a distribuição de máscaras de qualidade.
O índice calculado pelo grupo atribui nota 41 aos protocolos do governo federal, 57 às medidas adotadas nos estados e no Distrito Federal e 48 às das prefeituras das capitais, em média. Apenas três estados receberam notas inferiores à do governo federal: Rio de Janeiro, Roraima e Amapá.
Sergipe, Ceará e Pernambuco são os estados com políticas mais bem avaliadas pelos pesquisadores, com mais de 75 pontos na escala do índice. São Paulo recebeu nota 47, abaixo da média dos estados, principalmente porque muitas medidas, embora na direção correta, não são obrigatórias.
No cálculo do índice, as notas de políticas definidas como recomendações são reduzidas à metade, e ações menos complexas, que não exigem aumento de gastos nem coordenação com outras áreas de governo, têm peso menor. Foram analisadas políticas divulgadas pelos governos até o dia 21 de junho.
Em São Paulo, o governo estadual anunciou na semana passada o fim da restrição que impede as escolas de receber mais de 35% dos alunos matriculados por dia e uma redução dos limites de distanciamento a partir de agosto, além da antecipação da vacinação dos profissionais da educação.
A área em que os estados receberam melhor avaliação é a das políticas para ensino a distância. Apesar das dificuldades nos primeiros meses da pandemia, quando as escolas foram fechadas e a oferta de atividades remotas foi reduzida, houve melhorias neste ano.
O grupo não levou em conta no cálculo do índice o fato de as escolas terem reaberto ou não, porque seu objetivo era avaliar o preparo para a retomada das atividades presenciais. Até o dia em que o estudo foi concluído, 14 dos 27 estados não haviam retomado as atividades presenciais.
“Ainda que o risco de infecções graves em crianças seja baixo, deve demorar para que sejam incluídas na campanha de vacinação, e é por isso que precisamos de protocolos melhores”, diz a cientista política Lorena Barberia, da USP, coordenadora do grupo que criou o ISRAP.
Segundo os pesquisadores, muitos governos locais têm orientado professores a mandar para casa crianças com febre e suspender aulas, mas poucos estabelecem como obrigatório o encaminhamento de casos suspeitos à rede de saúde pública ou propõem estratégias para realização de testes precisos.
Só duas capitais e um estado previram em seus protocolos a distribuição nas escolas de máscaras de alta qualidade, do tipo PFF2 ou N95, que oferecem maior proteção contra o vírus. Em média, o índice do grupo atribuiu nota 57 às medidas tomadas nos estados nessa área. As capitais receberam nota 48.
O ISRAP aponta grande heterogeneidade nas políticas adotadas pelos governos locais –para os pesquisadores, um reflexo da falta de coordenação entre as autoridades. Em São Paulo, as normas estabelecidas pela capital receberam 65 pontos na escala do índice, bem acima da nota do estado.
“A implementação de muitas medidas não implica em custos nem exige grande esforço, mas mesmo assim elas têm sido negligenciadas em muitos lugares”, diz o pesquisador Luiz Canterelli, integrante do grupo. “Em outros, mesmo governos com poucos recursos adotaram protocolos mais rígidos.”
As políticas propostas pelo governo federal para imunização de professores e funcionários das escolas foram as únicas a receber nota máxima do índice, por garantirem prioridade aos profissionais na fila das vacinas. Governos locais receberam notas menores por causa de restrições impostas a grupos etários.
O grupo também defende maior transparência para as políticas adotadas, fator que considera essencial para assegurar a adesão de pais de alunos e profissionais à reabertura das escolas. Só metade dos estados divulgou seus planos em documentos claros e abrangentes.
A Rede de Pesquisa Solidária publicará nesta segunda (12) um boletim com a análise dos protocolos e uma base de dados com a pontuação recebida por cada unidade da federação em cada área analisada pelos pesquisadores para o cálculo do índice.