A história de Lampião, o “Rei do Cangaço”, foi contada por vários meios de comunicação, por toda parte do mundo. Mas, alguns fatos foram esquecidos ou não chegaram ao conhecimento do povo. É o caso vivido por ele e seu bando na cidade de Conceição, interior do estado da Paraíba, no ano de 1919. Nesse ano, Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, como era mais conhecido, começara seu martírio e sofria seus primeiros ferimentos à bala da sua história sangrenta de vida.
Foto histórica da casa onde Lampião se arranchou, no sítio Tabuleiro, município de Conceição
Durante muito tempo, a reportagem do portal Vale do Piancó Notícias, juntamente com o historiador Marcos José, buscaram rabiscos de fragmentos da passagem de Lampião pelo município de Conceição. Entre vários fatos, ele queimou dois engenhos, no município, na sua vinda corrida da cidade de Mossoró: o engenho no sitio Saco da Ingazeira, que hoje é de propriedade de Sevi Soares e outro no sítio Náfrica, que hoje pertence ao território de Santa Inês. O último tem suas ruínas no fundo das águas da barragem Santa Inês.
O momento mais marcante para a reportagem e para o historiador foi a localização da casa, no sítio Tabuleiro, na divisa do estado da Paraíba com o Pernambuco, local onde o “Rei do Cangaço” se arranjou, juntamente com seu bando de cangaceiros e mandou um recado para o então prefeito da cidade de Conceição, José Leite. No recado levado pelo portador (Figura não identificada), o cangaceiro exigia, como moeda de troca, para uma não invasão à cidade, mantimentos e armas de fogo.
De imediato, o prefeito José Leite mandou dizer, pelo mesmo portador, que o pedido seria atendido, mas ele (Lampião), deveria aguardá-lo, pois ele iria pessoalmente entregar ao cangaceiro, todos os pedidos solicitados.
Não sabia o prefeito que os boatos a respeito da presença do bandoleiro corriam nas ruas da cidade. E quando ele atravessou o rio Piancó, encontrou do outro ladovários homens civis armados, preparados para um combate com Lampião. O prefeito não teve outra escolha, a não ser seguir com destino ao sítio Tabuleiro, que fica, aproximadamente, há 18Km da cidade de Conceição.
Nos bastidores da ida são desconhecidos, mas a existência do combate contra os cangaceiros de Lampião deixou um saldo positivo para o prefeito José Leite. Ao surpreender o bando, os “Heróis” da cidade de Conceição conseguiram a proeza de acertar os primeiros tiros no “Rei do Cangaço”, em toda a sua história de existência. Foram dois tiros: um no braço e outro na virilha, conforme o próprio cangaceiro narrou no filme “Baile Perfumado”, narrado pelo historiador árabe, Abraão Benjamim, que, através de amizade com Padre Cícero, conheceu Virgulino. Depois da morte do padroeiro, o historiador procurou o cangaceiro e o acompanhou, pelas matas nordestinas, registrando as suas ações em fotos.
Foto da casa onde lampião se arranchou. Na foto, Gilberto Ângelo e Marcos José
O confronto entre prefeito da cidade de Conceição com seus homens e Lampião e seu bando rendeu histórias cômicas, como a de um senhor chamado Deco Ramalho, que depois do confronto, sumiu nas caatingas. Quando o bando de Lampião sumiu na mata, levando seu chefe ferido, o prefeito José Leite resolveu contar seus homens, visando saber se houve alguma baixa. Percebendo a falta do senhor Deco, o prefeito e seus amigos resolveram sair à procura dele. Nas proximidades de Conceição, ao passar por uma casa, o prefeito perguntou ao dono dela, se um senhor galego, baixo, de olhos pequenos não havia passado por ali. O dono da casa respondeu que por ali passara um senhor galego alto, numa velocidade acelerada e com os olhos enormes.
Uma pergunta a respeito de lampião circula nas mentes das pessoas, Uns o considera “herói”, outros bandidos. O fato é que o seu filme foi proibido de rodar, pelo Governo do Pernambuco e pelo presidente Getúlio Vargas, em virtude da mitologia criada, que o denominava como herói.
Outros “lampiões”, dos tempos modernos, surgiram na história das terras nordestinas, mas nenhum deles teve a ousadia do verdadeiro “Rei do cangaço”, Virgulino Ferreira da Silva, o lampião.
Num trecho do livro de Frederico Pernambucano de Melo existe um pequeno relato, que confirma os primeiros tiros do “Rei do Cangaço”, sofridos no sítio Tabuleiro, município de Conceição. O livro conta a trajetória de vida e morte de Lampião.
Virgulino Ferreira da Silva, mais conhecido como Lampião, nasceu em 7 de julho de 1897 na pequena fazenda dos seus pais em Vila Bela, atual município de Serra Talhada, no estado de Pernambuco. Era o terceiro filho de uma família de oito irmãos.
Lampião desde criança demonstrou-se excelente vaqueiro. Cuidava do gado bovino, trabalhava com artesanato de couro e conduzia tropas de burros para comercializar na região da caatinga, lugar muito quente, com poucas chuvas e vegetação rala e espinhosa, no alto sertão de Pernambuco (chama-se Sertão as regiões interiores e distantes do litoral, onde reinava a lei dos mais fortes, os ricos proprietários de terras, que detinham o poder econômico, político e policial).
Em 1915, acusou um empregado do vizinho José Saturnino de roubar bodes de sua propriedade. Começou, então, uma rivalidade entre as duas famílias. Quatro anos depois, Virgulino e dois irmãos se tornaram bandidos. Matavam o gado do vizinho e assaltavam. Os irmãos Ferreira passaram a ser perseguidos pela polícia e fugiram da fazenda. A mãe de Virgulino morreu durante a fuga e, em seguida, num tiroteio, os policiais mataram seu pai. O jovem Virgulino jurou vingança.
Lampião formou o seu bando a princípio com dois irmãos, primos e amigos, cujos integrantes variavam entre 30 e 100 membros, e passou a atacar fazendas e pequenas cidades em cinco estados do Brasil, quase sempre a pé e às vezes montados a cavalo durante 20 anos, de 1918 a 1938.
Existem duas versões para o seu apelido. Dizem que, ao matar uma pessoa, o cano de seu rifle, em brasa, lembrava a luz de um lampião. Outros garantem que ele iluminou um ambiente com tiros para que um companheiro achasse um cigarro perdido no escuro.
Comparado a Robin Hood, Lampião roubava comerciantes e fazendeiros, sempre distribuindo parte do dinheiro com os mais pobres. No entanto, seus atos de crueldade lhe valeram a alcunha de “Rei do Cangaço”. Para matar os inimigos, enfiava longos punhais entre a clavícula e o pescoço. Seu bando seqüestrava crianças, botava fogo nas fazendas, exterminava rebanhos de gado, estuprava coletivamente, torturava, marcava o rosto de mulheres com ferro quente. Antes de fuzilar um de seus próprios homens, obrigou-o a comer um quilo de sal. Assassinou um prisioneiro na frente da mulher, que implorava perdão. Lampião arrancou olhos, cortou orelhas e línguas, sem a menor piedade. Perseguido, viu três de seus irmãos morrerem em combate e foi ferido seis vezes.
Grande estrategista militar, Lampião sempre saía vencedor nas lutas com a polícia, pois atacava sempre de surpresa e fugia para esconderijos no meio da caatinga, onde acampavam por vários dias até o próximo ataque. Apesar de perseguido, Lampião e seu bando foram convocados para combater a Coluna Prestes, marcha de militares rebelados. O governo se juntou ao cangaceiro em 1926, lhe forneceu fardas e fuzis automáticos.
Em 1929, conheceu Maria Déa, a Maria Bonita, a linda mulher de um sapateiro chamado José Neném. Ela tinha 19 anos e se disse apaixonada pelo cangaceiro há muito tempo. Pediu para acompanhá-lo. Lampião concordou. Ela enrolou seu colchão e acenou um adeus para o incrédulo marido. Levou sete tiros e perdeu o olho direito.
O governo baiano ofereceu 50 contos de réis pela captura de Lampião em 1930. Era dinheiro suficiente para comprar seis carros de luxo.
Lampião morreu no dia 28 de julho de 1938, na Fazenda Angico, em Sergipe. Os trinta homens e cinco mulheres estavam começando a se levantar, quando foi vítima de uma emboscada de uma tropa de 48 policiais de Alagoas, comandada pelo tenente João Bezerra. O combate durou somente 10 minutos. Os policiais tinham a vantagem de quatro metralhadoras Hotkiss. Lampião, Maria Bonita e nove cangaceiros foram mortos e tiveram suas cabeças cortadas. Maria foi degolada viva. Os outros conseguiram escapar.
O cangaço terminou em 1940, com a morte de Corisco, o “Diabo Loiro”, o último sobrevivente do grupo comandando por Lampião.