Os advogados de Steve Bannon, ex-estrategista de Donald Trump, fecharam um acordo para libertá-lo em troca de uma fiança de US$ 5 milhões (R$ 27,7 milhões), segundo a agência Reuters e o canal NBC.
O acordo foi fechado na tarde desta quinta (20). Não foi confirmado se o valor já foi pago e nem se ele já deixou a prisão. Segundo a NBC, Bannon teria de apresentar inicialmente garantias no valor de US$ 1,75 milhão, que poderiam incluir dinheiro vivo e propriedades, até 3 de setembro.
Bannon, 66, foi preso de manhã, pela acusação de desviar US$ 1 milhão de uma campanha virtual de doação para a construção de um muro na fronteira entre EUA e México, que teria arrecado ao todo US$ 25 milhões.
A Justiça federal de Nova York determinou que ele terá o passaporte retido e não poderá usar aviões ou barcos privados até a conclusão do processo. Sua circulação deverá ficar restrita a Nova York, Washington e Connecticut.
O estrategista participou da audiência de custódia de modo virtual. Segundo a CNN, ele estava bronzeado, usava máscara e se declarou inocente.
Um dos principais articuladores da ultradireita do mundo, Bannon é próximo da família Bolsonaro. Ele criou um projeto chamado “O Movimento”, para unir líderes populistas do mundo que defendem ideias de direita, e nomeou o deputado federal Eduardo Bolsonaro como seu representante no Brasil.
A campanha que motivou a prisão, batizada de “Nós Construímos o Muro”, levantou US$ 25 milhões (R$ 141 milhões na cotação desta quinta-feira). Bannon e outros envolvidos teriam enganado os doadores e usado o dinheiro para custear gastos pessoais, de acordo com o Departamento de Justiça dos EUA.
Além de Bannon, foram indiciados e presos Brian Kolfage, 38, veterano da Força Aérea, Andrew Badolato, 56, que atua no mercado financeiro, e Timothy Shea, 39. Os quatro podem pegar até 20 anos de prisão.
Procuradores federais de Nova York disseram que o dinheiro das doações ajudou os envolvidos a levar uma vida de gastos excessivos.
Bannon teria recebido mais de US$ 1 milhão (R$ 5,6 milhões) da campanha por meio de uma organização sem fins lucrativos.
Já Kolfage teria se apropriado de US$ 350 mil (R$ 1,9 milhão) de maneira similar. O ex-militar fez fortuna com sites de direita. Recentemente, começou um negócio de produção de máscaras.
Iniciada no fim de 2018, a campanha prometia que todo o dinheiro seria usado para ajudar na construção do muro na fronteira, sem que os organizadores obtivessem lucro com ela. A ação pretendia construir partes do muro em áreas privadas perto da fronteira no Texas e Novo México.
“Os réus se engajaram em fraudes quando desrespeitaram o uso dos fundos doados. Eles não apenas mentiram aos doadores, mas elaboraram esquemas para esconder a apropriação dos fundos ao criar faturas e contas falsas para ‘lavar’ as doações e encobrir seus crimes”, disse Philip R. Bartlett, um dos inspetores do caso, em comunicado.
Promessa-chave da campanha de Trump em 2016, a construção do muro foi contida por processos na Justiça e pela oposição no Congresso. Assim, foram construídos até agora apenas 442 km do bloqueio, segundo o Departamento de Fronteiras. Desses, apenas 48 km são trechos novos, e o resto se refere ao reforço de barreiras existentes.
A divisa EUA-México tem ao todo 3.145 km, e cerca de 1.000 km já contavam com muros ou cercas antes de Trump assumir. Em cerca de metade dela, os dois países são separados pelo rio Grande.
Trump disse a repórteres na Casa Branca que se sente “muito mal” pelas acusações a Bannon, mas procurou se distanciar do estrategista e do suposto esquema de fraude. “Acho que é um fato triste”, disse o presidente. “Não lido com ele há anos, literalmente anos.”
A TRAJETÓRIA DE BANNON
Bannon é um dos principais ativistas de ultradireita dos EUA e impulsionou ideias como o combate à imigração no país. Especialista no uso de redes sociais e estratégias digitais para campanhas políticas, costuma dizer que seu objetivo é lutar contra a classe política tradicional, a globalização e as grandes corporações.
Ele fez carreira no setor bancário e atuou no Goldman Sachs. Em 2012, tornou-se diretor do Breitbart News, site que ajudou a fundar. A página dá espaço para ideias ligadas ao nacionalismo extremo, neonazismo e supremacismo branco.
Bannon também trabalhou na Cambridge Analytica, empresa que coletou dados de milhões de usuários do Facebook, sem consentimento, para depois enviar mensagens políticas ultrasegmentadas.
Funcionários da empresa acusam Bannon de ter participado de testes, a partir de 2014, para enviar mensagens a eleitores para estimular sentimentos como raiva e medo e, assim, influenciar suas posições políticas. Também dizem que a prática foi usada muitas vezes nos anos seguintes a pedido dele. O estrategista nega.
Em 2016, Bannon foi diretor da campanha de Trump, tornando-se um dos principais responsáveis pela vitória, ao aproximar o republicano de bandeiras conservadoras e fomentando o rancor de partes do eleitorado em relação a temas como a imigração, por meio do uso intenso e direcionado de redes sociais.
Após a eleição, assumiu o cargo de estrategista-chefe da Casa Branca. No entanto, foi demitido meses depois, em agosto de 2017, por se desentender com o presidente. Mesmo assim, seguiu dando apoio a Trump e a outros candidatos republicanos nos bastidores.
O episódio que despertou a fúria do líder americano é de 2017, quando o então assessor foi citado em um livro chamando um dos primeiros-filhos de “traidor”.
A declaração, negada por Bannon, teria sido em relação ao encontro de Donald Trump Jr., o primogênito do presidente, com agentes russos para conseguir informações que prejudicassem Hillary Clinton, adversária do republicano na eleição de 2016.
Bannon também buscou expandir o nacionalismo populista em outros países, especialmente na Europa. Se aproximou de defensores do brexit e de nomes como Marine Le Pen, líder de extrema direita na França, de Matteo Salvini, ex-ministro do Interior na Itália, e Viktor Orbán, premiê da Hungria.
Na América Latina, ficou próximo da família Bolsonaro. Antes da campanha de 2018, encontrou-se com Eduardo Bolsonaro, e os dois passaram a manter contato.
Em entrevista à Folha logo após a eleição de 2018, Bannon elogiou Eduardo e seus assessores, bem como a trajetória e as propostas de Jair Bolsonaro. “Compartilhamos a mesma visão de mundo”, disse.
Em março de 2019, a inclusão do nome do estrategista na lista de convidados e anfitriões de honra da comitiva de Jair Bolsonaro a Washington incomodou integrantes do governo Trump. À época, membros da Casa Branca afirmavam não entender a obsessão de aliados do presidente brasileiro por Bannon, que, segundo eles, já não tinha mais influência no governo e é detestado por Trump.