O governo do Cazaquistão correu na sexta-feira (10) para desmentir a notícia veiculada em portais chineses de que uma pneumonia mortal pior do que a Covid-19 havia deixado mais de 1,7 mil mortos. Mesmo assim, o assunto apareceu entre os mais compartilhados nas redes sociais e levou pessoas a se perguntarem: há risco de estarmos diante de uma nova pandemia?
Fontes diplomáticas e sanitárias ouvidas pelo G1 disseram que não. Ao menos em relação aos casos de pneumonia no Cazaquistão, não parece ser o caso de um novo alerta global — e sim um mal entendido sobre os números relacionados ao novo coronavírus.
Veja abaixo 5 pontos para entender a confusão gerada pela pneumonia no país asiático.
- Outras pneumonias — nem toda pneumonia é viral ou pode se espalhar como uma pandemia. O próprio governo cazaque reconhece que os números obtidos pela China se referem às várias origens da doença, que nem sempre são Covid-19 (leia mais no fim da reportagem).
- Subnotificação — nem todas os casos do novo coronavírus ou mesmo mortes pela doença são relatadas como tal. Inclusive, o Cazaquistão só passou a incluir assintomáticos na conta da epidemia mais recentemente, o que indica a baixa notificação da doença no país.
- Excesso de mortes — assim como ocorre no Brasil, outros países passaram a notificar mortes por insuficiência respiratória (ou Síndrome Respiratória Aguda Grave). Essas mortes incluem casos não notificados ou não testados de Covid-19, mas também podem se referir a outras causas, como uma gripe comum.
- Testes de má qualidade — os testes precisam ser feitos dentro de uma janela de tempo específica no doente. Além disso, exames de qualidade ruim indicam falsos casos negativos de Covid-19.
- Interesse global — o Cazaquistão não é um país isolado no mundo: há representações de diversos órgãos internacionais e de outros governos, inclusive uma Embaixada brasileira. Caso houvesse um novo surto não relacionado à Covid-19 por lá, outros organismos teriam feito relato semelhante ao da China.
Em nota enviada ao G1, a Embaixada do Cazaquistão no Brasil reforçou que não há outro tipo de epidemia de pneumonia circulando no país e chamou a informação dada pela Embaixada da China a veículos chineses de "fake news"
"Observamos que o Ministério da Saúde da República do Cazaquistão negou oficialmente informações divulgadas na mídia chinesa sobre novo tipo de pneumonia no Cazaquistão, o que é fake news e uma informação falsa" — Embaixada do Cazaquistão no Brasil
Casos de Covid-19 não notificados
Segundo o governo do Cazaquistão, as mais de 1,7 mil mortes por pneumonia relatadas no primeiro semestre de 2020 pela imprensa chinesa se referem a todas os tipos possíveis de pneumonia, que incluiriam casos não diagnosticados de Covid-19.
O diretor de emergências da OMS, Mike Ryan, até disse que a organização investigaria o caso cazaque. Porém, ele afirmou: "É possível que esses casos de pneumonia sejam casos da Covid-19 não diagnosticados".
Consultado pelo G1, o epidemiologista Paulo Lotufo, da Universidade de São Paulo (USP), concorda com a suspeita da OMS. Segundo ele, o Brasil viveu situação parecida ao registrar aumento nas mortes por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), que de início não eram relacionadas ao coronavírus. E, com a pandemia de Covid-19, notícias do tipo deixam a população em alerta de uma maneira que normalmente não ocorreria.
"Ou não testam ou não fazem esses testes da maneira correta, então saem esses números que dão a impressão de ser algo imenso", comenta Lotufo.
Os números da Covid-19 no Cazaquistão também reforçam a tese de baixa notificação: das 264 vítimas registradas, mais de 40% foram confirmadas somente nos nove primeiros dias de julho — a notícia dada pela imprensa chinesa falava em uma alta nas mortes pela tal "pneumonia mortal" no mesmo período.
Mesmo com a epidemia ainda crescente, o governo cazaque diz que situação da doença no país "sob controle".
"O governo do Cazaquistão tomou todas as medidas necessárias para conter a disseminação do coronavírus no país, em particular, um regime de quarentena foi introduzido para esse fim de 5 a 19 de julho deste ano", disse a Embaixada, em nota.