Primeiro, antes de apresentar as peças do Real que “valem ouro”, fica o esclarecimento sobre o termo numismática e como o setor tem se adaptado à crise do coronavírus. Um numismata é um estudioso em cédulas e moedas antigas. Ele pode trabalhar unicamente com o estudo, ser colecionador ou mesmo vendedor de material.
Existem diversas lojas numismáticas que vendem cédulas e moedas antigas do Brasil, desde o período imperial. Em tempos de pandemia, o mercado também buscou se adaptar à tecnologia com vendas através de sites ou simplesmente comercialização por leilões organizados entre colecionadores através de grupos de WhatsApp.
Em conversa com a CNN, o advogado e diretor social e de divulgação da Sociedade Numismática Brasileira (SNB), Bruno Pellizzari, de 24 anos, contou que o setor continuou movimentado mesmo com a crise do coronavírus, pois muitas pessoas encontraram tempo para organizar a coleção e assim comprar virtualmente peças faltantes.
“Os maiores impactos no setor foram sentidos por quem tem loja física e não possui atendimento via internet. Eles tiveram de se reinventar. Para aqueles que trabalham pela internet, como o meu caso, pelo fato de as pessoas estarem em casa, elas passaram a se dedicar a outras atividades, e a numismática entra como hobby. Elas aproveitaram para organizar as coleções e buscar novas peças, o que fez o setor manter a operação”, explicou.
O engenheiro Ruy Peretti, de 42 anos, é colecionador e membro da SNB. Ele é um dos que participam de leilões, vendas e trocas pelo aplicativo de mensagem. “No WhatsApp você pode anunciar de maneira dinâmica para fazer as vendas”, contou. Ele também afirmou que continuou a participar dos leilões mesmo com a quarentena, apesar de alguns colecionadores “ficarem receosos antes de fechar os negócios”.
Quem define o preço?
Catálogos numismáticos indicam preços de cédulas e moedas antigas
Foto: André Rigue/CNN
“O que dita o valor da peça é a quantidade que foi feita, o estado de conservação e demanda do mercado. Existem moedas do Império que valem poucos reais, devido ao fato de terem sido feitas uma grande quantidade. Quando falamos de moedas do Real, por exemplo, não podemos falar que existem peças raras, mas sim escassas e muito procuradas pelos colecionadores”, explica Pellizzari.
As regras do setor numismático que definem o valor de uma peça são as mesmas em todo o mundo. Cada país, no entanto, costuma ter catálogos publicados por estudiosos com indicações de valores das peças.
No Brasil, entre os colecionadores de cédulas, uma das publicações com maior referência é a ‘Cédulas do Brasil de 1833 a 2018’, de Claudio Amato, Irlei Soares das Neves e Julio Ernesto Schutz. Já entre as moedas, destacam-se o ‘Livro Bentes das Moedas do Brasil’, última edição em 2019, de Rodrigo Maldonado, e o ‘Livro das Moedas do Brasil de 1643 a 2018’ de Claudio Amato e Irlei Soares das Neves.
Sobre o estado de conservação, os colecionadores sempre irão preferir as peças que estejam mais próximas possível do 100% de qualidade. Uma cédula sem nenhuma avaria (aquela retirada diretamente do caixa eletrônico, com “cheiro de banco”, sem nenhuma dobra, amasso ou risco) é classificada como “flor de estampa”.
Já entre as moedas, as que são retiradas direto de sachês do Banco Central são consideradas “flor de cunho” – não tiveram contato com “mãos” ou circulação no mercado e por isso têm preservação total.
R$ 1
Coleção com variações de cédulas de R$ 1
Foto: André Rigue/CNN
Quem coleciona material numismático não busca apenas cédulas e moedas de planos econômicos que deixaram de circular pelo Brasil, como Réis, Cruzeiros, Cruzados, Cruzados Novos e Cruzeiros Reais. Peças do Real também fazem parte dos catálogos. E isso inclui as “antigas” cédulas de R$ 1, de cor verde e desenhos da Efígie da República e de um beija-flor.
Apesar de estarem fora de circulação, ainda existem espalhadas pelo Brasil 148.721.985 unidades de cédulas de R$ 1, segundo consulta ao site do Banco Central realizada na data de publicação desta reportagem. E das cédulas de R$ 1, conforme o catálogo mencionado anteriormente, existe um modelo com valor de R$ 275.
Mas antes de achar que os colecionadores pagarão R$ 275 por qualquer nota, saiba que conseguir a cédula mais “escassa” da série de R$ 1 pode ser tão difícil quanto encontrar “uma figurinha premiada”. A maior parte das cédulas do Real não vale muito além do valor de face.
Ruy explica: “Existe uma série específica que é bem valorizada quando em estado flor de estampa [custa os tais R$ 275]. É a que tem junto à numeração as letras BA, nessa ordem, assinadas por Pedro S. Malan e Gustavo J. L. Loyola. São séries que vão de 0001 até 0072 [uma série é determinada pelos primeiros quatro números da cédula]. As demais variam de R$ 10 a R$ 95, dependendo da série e de estarem flor de estampa”.
Cédula de R$ 1 com as letras BA e assinaturas de Pedro S. Malan e Gustavo J. L. Loyola
Foto: André Rigue/CNN
Polímero
Cédula de R$ 10 de polímero comemorativa aos 500 anos do descobrimento
Foto: André Rigue/CNN
Outro modelo de cédula que desperta o interesse dos colecionadores é a nota de R$ 10 de polímero. A emissão comemorativa do ano de 2000 tem a efígie de Pedro Álvares Cabral, em homenagem aos 500 anos do descobrimento do Brasil. Entre os colecionadores, o preço de um exemplar pode chegar a custar R$ 110 – lembrando sempre que o preço é referência ao estado máximo de conservação (flor de estampa).
Famílias do Real
Cédulas de R$ 2 com letras CJ, de 2015, e de R$ 5 com letras DF, de 2016, que são valiosas para colecionadores
Foto: André Rigue/CNN
Outras peças do Real têm valor significativo para os colecionadores, como a cédula de R$ 100 da primeira família, de 1994, com assinaturas de Rubens Ricupero e Pedro S. Malan, que tem uma característica especial. “Apenas três séries [AA 1199, 1200 e 1201] não aparecem com o dístico “Deus Seja Louvado”. Então a peça tem um alto valor para os colecionadores pela dificuldade de achar”, afirma Ruy. Uma peça desse modelo em estado flor de estampa chega ao preço de R$ 4,4 mil.
Das notas do Real da segunda família, existe uma série da cédula de R$ 2, com as letras CJ, de 2015, e assinaturas de Henrique Meirelles e Alexandre Tombini, que em estado flor de estampa é vendida por até R$ 250. Dois modelos de R$ 5, com letras CJ (assinaturas de Henrique Meirelles e Alexandre Tombini), de 2015, e DF (assinaturas de Henrique Meirelles e Ilan Goldfajn), de 2016, tiveram uma baixa tiragem e são comercializadas entre os colecionadores por até R$ 260 cada.
A cédula considerada mais difícil de ser encontrada da segunda família do Real é a cédula de R$ 20 que tem as letras CD e as assinaturas de Joaquim Levy e Alexandre Tombini, de 2014. Por causa da baixa tiragem (apenas 240 mil impressões), ela custa até R$ 380 em estado flor de estampa.
Moedas comemorativas
Em destaque, moedas comemorativas do Real com baixa tiragem
Foto: André Rigue/CNN
Sobre as moedas do Real que podem ter bom valor colecionável, as de maior destaque numismático são as comemorativas que tiveram baixa tiragem. “A moeda circulante com a menor cunhagem do Real é a R$ 1 de 1998, com 600 mil peças, comemorativa ao cinquentenário dos direitos humanos. Vale no mercado numismático algo entre R$ 100 e R$ 250, dependendo do estado de conservação”, conta Pelizzari.
Segundo o diretor da SNB, outros modelos comemorativos de destaque são “as moedas de R$ 0,10 e R$ 0,25 centavos da primeira família do Real de 1995, que tratam do tema ‘alimentos para todos’ da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), que valem entre R$ 30 e R$ 50 cada”.
Das moedas de circulação normal (não comemorativas), Ruy destaca dois modelos de elevado valor entre os colecionadores. “As moedas de R$ 0,05 e R$ 0,10 da segunda família do Real, de 1999. Em estado flor de cunho, pode chegar a mais de R$ 100.”
Olimpíadas
Moeda da entrega da bandeira é a mais difícil de encontrar com o tema olímpico
Foto: André Rigue/CNN
As moedas comemorativas dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro de 2016 estão presentes na maioria das coleções dos numismatas. No entanto, existe apenas um modelo de valor elevado. “É a moeda comemorativa da entrega da bandeira olímpica, fabricada em 2012 [cunham de 2.016.000 unidades]. Ela vale algo em torno de R$ 60 a R$ 100, dependendo sempre da conservação. As outras moedas olímpicas não valem muito além do valor de face, pois tiveram uma boa tiragem [20 milhões cada]”, explica Pelizzari.