A concessionária Lamsa, que administra o pedágio da Linha Amarela do Rio de Janeiro, é suspeita de ter pago propina a políticos e agentes públicos para conseguir estender o contrato de concessão por mais 15 anos.
O núcleo investigativo da Record TV conversou com um engenheiro da Prefeitura, na gestão de Eduardo Paes, e hoje delator da Lava Jato. Ele confirmou que dinheiro vivo desviado das obras superfaturadas era entregue ao grupo que participava do esquema.
"Eu posso falar que as obras tinham um sobre preço em geral. Isso é institucionalizado mesmo, sempre na prefeitura existiu", dusse o egenheiro. "Quando eu cheguei lá, tinha uma regra: o que tinha de sobra, podia fazer o pagamento de vantagens indevidas."
Ele detalhou como prefeitura e a concessionária acertavam as obras. "No projeto executivo, as coisas são mais detalhadas. E nessa forma de detalhar, você começa a encontrar elementos que possam maximizar o lucro das empresas e, em geral, o retorno para os servidores."
Em dezembro do ano passado, o então secretário da Casa Civil, Pedro Paulo, pediu à Lamsa um estudo para melhorar o projeto de 25 km na via expressa que liga a Zona Norte à Barra da Tijuca. Os projetos escolhidos totalizaram um investimento de R$ 251 bilhões.
Como era o esquema
Para realizar as obras, a concessionária ganharia a extensão do contrato por mais 15 anos além de um cronograma de reajuste nas tarifas de pedágio. Mas o delator revela que o valor pago pela prefeitura foi superfaturado e parte do dinheiro voltou para as mãos dos agentes públicos e políticos em forma de propina.
O engenheiro explica: "R$ 251 milhões ia dar para quantas obras?. Aí foi verificado o orçamento, e a partir dali colocou uma planilha de multiplicador de dois ponto dois. Então a cada R$ 10, você estaria pagando R$ 22. E com esse multiplicador, você considerava vários itens que você não contemplava dentro do seu orçamento inicial. Então, desta forma, garantiu-se na lamsa, que cada obra que foi feita no termo aditivo, da época lá, que tinha esse multiplicador e que gerava dentro desse multiplicador, algumas vantagens para os servidores, para os seus vários níveis hierárquicos."
A taxa de multiplicação era uma espécie de fator de correção usado nos contratos para beneficiar a empresa. Nas planilhas, as obras custariam pouco mais de R$ 110 bilhões. Mas ao aplicar o fator de correção, o resultado final foi de cerca de R$ 251 milhões.
O superfaturamento destes projetos foi mencionado na CPI da Linha Amarela na Câmara dos Vereadores do Rio. As obras foram feitas durante a gestão do ex-prefeito Eduardo Paes e com o conhecimento do alto escalão da prefeitura.
Segundo engenheiro, quem definia o percentual de multiplicação era o subsecretário de Obras, Alexandre Pinto.
Pinto confessou o esquema ao Ministério Público Federal.
"O centro disso tudo não era a secretaria de obras em si", afirmou. "A gente tinha casos, das grandes obras, que as determinações não vinham da Secretaria de Obras, vinham de outro lugar. Na verdade vinham do gabinete do ex-prefeito."
Dinheiro vivo
O ex-secretário de Eduardo Paes foi condenado pela Justiça do Rio a mais de 20 anos de cadeia por corrupção passiva e associação criminosa. As investigações comprovaram que ele foi um dos beneficiários no superfaturamento da Linha Amarela. Os percentuais de participação na fraude eram estipulados em planilha da concessionária.
Segundo o delator, as propinas eram pagas na sede administrativa da concessionária, sempre em dinheiro vivo.
O engenheiro da Prefeitura diz que desse contrato milionário também saíram recursos para abastecer campanhas eleitorais.
"No caso da Lamsa e da Linha Amarela, as inforamções era que eramR$ 7 milhões para a campanha (de Eduardo Paes)".
O servidor também detalhou na denúncia a forte influência que altos executivos da Invepar, empresa que controla a Linha Amarela, tinham na Prefeitura na gestão de Eduardo Paes. Na época, a Invepar tinha como sócios a empreiteira OAS e dois fundos de pensão. Depois da Lava Jato, a empreiteira saiu da empresa.
Atualmente, a Invepar tem como acionistas fundos de pensão de funcionários do Banco do Brasil, Petrobrás, Caixa e um fundo formado por credores da OAS. A Invepar entrou em crise depois da saída da OAS e tem uma dívida bilionária com o fundo Munbadala, fundo soberano de Abu Dhabi.
"Não tinha uma regra e não tinha como ter uma regra até porque tudo que era combinado não era cumprido", diz o engenheiro. "A primeira coisa que o empreiteiro faz é chamar você de chefe e dizer que está com prejuízo. É sempre assim, isso não é só coimigo é comigo e com todos da cadeia e com o próprio prefeito. o próprio prefeito repetia isso o tempo inteiro, já me chama de chefe e dizem que eu tô no prejuízo. então, as coisas eram combinadas e não eram cumpridas. na verdade você coordenava uma grande farsa, pq tudo que era acertado não era cumprido."
Os agrados da concessionária não se limitavam às propinas. A Lamsa também oferecia um pacote de benefícios sociais como presentes caros, jantares em bons restaurantes e até festas em motel com garotas de programa.
A Prefeitura trava na Justiça uma batalha contra a Lamsa por causa das irregularidades no contrato de concessão. No ano assado, a Prefeitura conseguiu uma liminar na Justiça para interromper a cobrança. O Tribunal de Justiça voltou atrás e a cobrança foi retomada. No dia 12 de março houve uma tentativa de conciliação, sem acordo.
O que dizem os citados
Em nota, a Lamsa – Linha Amarela S/A afirmou que desconhece a prática de corrupção nas ruas obras.
A construtora OAS informou que só irá se manifestar se for acionada pela Justiça, mas não tem conhecimento dos fatos narrados pelo delator.
O ex-prefeito do Rio, Eduardo Paes, e o deputado federal Pedro Paulo (DEM), negaram envolvimento no caso e em qualquer esquema de corrupção.
O processo movido pela Prefeitura do Rio contra a concessionária Lamsa está suspenso há quatro meses e, segundo o Tribunal de Justiça do Estado, está à espera de acordo.