Um jovem que aposta e investe diariamente no sonho de ser maestro e transformar vidas por meio da música enfrenta dificuldades para se dedicar ao que almeja. Lucas Rodrigues, de 19 anos, mora no município de Sousa, no Sertão da Paraíba. Com aulas presenciais suspensas por causa da pandemia de Covid-19, ele e outros alunos de escolas públicas do estado justificam o motivo para serem favoráveis ao adiamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020, com base nos obstáculos que enfrentam, em casa, para estudar para as provas.
Lucas é paulista, mas mora em uma casa alugada na Paraíba, com os avós, desde os nove meses de idade. Desanimado, ele expôs a situação financeira da família, que desde o início da pandemia de Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, só conseguiu pagar pelo serviço de internet por um mês.
“Está afetando tanto minha família, quanto os meus estudos. Só vim pagar minha internet agora. O [dinheiro] que entra a gente faz a feira e pagas as contas, elas não param de aparecer. Cada vez mais vai agravado a situação. Eu sei que é importante para os meus estudos. Mas no fim do mês não está sobrado, sabe? A minha família está focando em sobreviver”, desabafou.
O acesso mensal por um mega de internet custa R$ 65, quantia que compromete outras despesas da casa. Mesmo com o esforço que os avós do jovem fizeram para custear o serviço, ele não funciona por causa da baixa velocidade. Quando as opções de estudar se esgotam, ele recorre à solidariedade dos vizinhos que liberam a senha pessoal para ele.
Lucas estuda na Escola Cidadã Integral Mestre Júlio Sarmento, em tempo integral, que tem 174 alunos matriculados na 3ª série do ensino médio, todos inscritos no Enem 2020, segundo o coordenador da instituição, João Alexandre.
Com o dia quase que inteiro dedicado aos estudos, a estratégia adotada por Lucas foi a de aproveitar ao máximo a explicação dos professores em sala de aula e revisar os conteúdos da prova em casa. Segundo ele, o esquema está quase impossível de ser seguido desde que começou a cumprir o isolamento social.
“Tirava dúvidas com os professores e tinha os livros da biblioteca [que está fechada]. Agora a gente conta com poucos recursos. Estou estudando pelos livros didáticos da escola. A gente está enfrentando dificuldade para absorver conhecido, no aprendizado. Os professores [presencialmente] estão fazendo falta”, prosseguiu.
Lucas teve a rotina de preparação para o Enem prejudicada por causa da suspensão de aulas presenciais — Foto: Lucas Rodrigues/Arquivo pessoal
Aprendendo a vencer as dificuldades diariamente, o estudante se justifica com base nelas para se posicionar a favor do adiamento do Enem, neste ano.
"É difícil para quem é estudante, sonha em entrar em uma faculdade e fazer o curso dos sonhos, como há muito tempo vinha desejado. A gente passou a vida toda estudando e agora não vai conseguir entrar na universidade esse ano. É um ano perdido, essa é a realidade", destacou.
Mesmo com a incerteza que o futuro proporciona, Lucas segue firme com o objetivo de também seguir carreira acadêmica. Ele acredita que universidades públicas representam sinônimos de transformação social para muitos jovens do Brasil. “Se a escola prepara para o futuro, a universidade já é o meu futuro”, reforçou.
Até conseguir trabalhar com o que ama, ele encontra leveza no período de pandemia por meio da música. Quando não estuda, toca trombone para se expressar e mostrar ao mundo, nem que seja o dele, o que sente.
Atividades remotas durante a pandemia
Segundo a coordenação da Escola Cidadã Integral Mestre Júlio Sarmento, a unidade iniciou a realização de atividades remotas, com o uso de plataformas digitais, no dia 26 de abril. Os alunos que não contam com acesso à internet, podem buscar materiais impressos na própria instituição.
Ainda conforme a direção, um plano estratégico foi elaborado pelos professores com conteúdos voltados para atualidades e áreas do conhecimento propostas pelo Enem. Além disso, semanalmente, o governo estadual envia temas para o desenvolvimento de redações, com a correção de profissionais da unidade de ensino.
Estudantes da Paraíba relatam dificuldades no estudo durante quarentena
Estudantes de escolas públicas temem desvantagem
Outros alunos de escolas públicas da Paraíba também enfrentam obstáculos semelhantes aos Lucas. Muitos não têm recursos básicos para realizar as atividades remotas, como um computador. Por causa da realidade sem estrutura, eles temem a desvantagem que podem levar diante de estudantes de escolas particulares, que têm preparação e acompanhamento diário para as provas.
O estudante Kelvim Kel é um deles. Sem conforto, sentado em um tapete com o caderno nas mãos, ele desabafou sobre a rotina que vivencia. “Não tem computador, internet de qualidade e professores à disposição”, enfatizou.
Jamilly Azevedo estava otimista para a prova, mas sem aulas presenciais conta com a perseverança para se dedicar aos estudos na cozinha de casa.
“Diferente dos alunos de escola particular, nós não temos acompanhamento diário para o Enem. Na propaganda [do Governo Federal] falam que não podem faltar médicos. Que eles deem espaço para nós de comunidades carentes virarmos médicos para tornar o Brasil um país melhor”, reforçou.
Enem 2020 será adiado e enquete deve escolher datas
O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) será adiado pelo período entre 30 e 60 dias após o que estava previsto em edital, segundo decisão tomada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e Ministério da Educação (MEC), na última quarta-feira (20).
A medida foi tomada após questionamentos judicias que cobravam o adiamento da prova por causa da pandemia da Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, que resultou na suspensão de aulas em escolas como ação preventiva à propagação da doença.
A prova tradicional estava prevista para 1º e 8 de novembro. Com o novo posicionamento, o governo afirmou que vai fazer uma enquete com os participantes para definir as novas datas.
Paraíba registra 174 mil candidatos inscritos no Enem 2019 — Foto: Ana Carolina Moreno/G1
Paraíba registra 174 mil candidatos inscritos no Enem 2019
A Paraíba registrou 174.608 inscrições no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2019, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Em todo o Brasil foram contabilizados 6,3 milhões de inscritos.
O Enem 2019 contou com 180 questões. No dia 3 de novembro foram realizadas as provas de linguagens, códigos e suas tecnologias; redação; e ciências humanas e suas tecnologias. Já no dia 10 de novembro foram aplicados os exames de ciências da natureza e suas tecnologias; e matemática e suas tecnologias.