O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta sexta-feira (24) que o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, condicionou uma troca no comando da Polícia Federal a uma indicação para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). No segundo semestre, o decano da corte, ministro Celso de Mello, será aposentado compulsoriamente por idade.
"Mais de uma vez, o senhor Sergio Moro disse para mim: Você pode trocar o Valeixo sim, mas em novembro, depois que você me indicar para o Supremo Tribunal Federal", afirmou o presidente, em referência a Mauricio Valeixo, que foi exonerado do cargo de diretor-geral da Polícia Federal pela manhã. “É desmoralizante para um presidente ouvir isso. Mais, ainda, externalizar”.
Bolsonaro disse que Moro afirmou durante reunião que só aceitaria a saída do diretor da PF caso pudesse indicar o substituto e não acatar um nome escolhido pelo presidente. "Eu não preciso pedir autorização para trocar ninguém", disse.
Pelas redes sociais, o ex-ministro da Justiça rebateu as acusações. Moro disse que a permanência do ex-diretor da PF "nunca foi utilizada como moeda de troca para minha nomeação para o STF". "Aliás, se fosse esse o meu objetivo, teria concordado ontem com a substituição do Diretor Geral da PF", escreveu.
Jair Bolsonaro negou a principal acusação feita pelo ex-ministro da Justiça em entrevista coletiva, a de que ele tem a intenção de interferir na condução das investigações feitas pela PF. "Tenho que ter um relatório do que aconteceu nas últimas 24 horas, nunca pedi o andamento de qualquer processo", afirmou.
O presidente discursou cercado pelo vice-presidente Hamilton Mourão e por seus demais ministros, incluindo os oriundos da ala militar e o ministro da Economia, Paulo Guedes.
Em seu pronunciamento, o ex-ministro Sergio Moro afirmou que não assinou o ato publicado no Diário Oficial da União da demissão de Valeixo, que trazia o seu nome. Ele também disse que não procederia a versão de que o ex-diretor-geral da PF pediu demissão do cargo.
Bolsonaro afirmou que "à noite, eu e o doutor Valeixo conversamos por telefone, e ele concordou com a exoneração a pedido. Desculpe, senhor ministro: o senhor não vai me chamar de mentiroso". O presidente citou conversa entre diretor-geral e superintendentes regionais da PF em que Valeixo relatava ter intenção de deixar o cargo.
Segundo a âncora da CNN Daniela Lima, interlocutores do delegado afirmam que ele foi procurado para saber se a exoneração poderia ser publicada como sendo "a pedido" e Valeixo teria respondido com "já que estou fora, tanto faz".
"Ego"
O discurso de Bolsonaro se centrou na narrativa de que Sergio Moro é uma "pessoa que tem um compromisso consigo próprio, com o ego e não com o Brasil". O presidente também relatou ter dito a deputados que "hoje vocês vão conhecer quem realmente não me quer na cadeira presidencial".
Ele relembrou um episódio de 2017, quando o então juiz federal ignorou um pedido de cumprimento do então deputado federal em um aeroporto. "Confesso que fiquei triste, porque ele era um ídolo para mim".
O presidente disse ter sido procurado por Moro quando ainda estava em campanha e o agora ex-ministro da Justiça era juiz federal. Essa sinalização teria acontecido entre o primeiro e o segundo turno, quando Moro teria se oferecido para visitar Bolsonaro no hospital.
Distanciando o resultado das eleições do prestígio pessoal do ex-juiz, Bolsonaro disse que "não quis se aproveitar do prestígio dele para conseguir a vitória no segundo turno".
O presidente se queixou de ele ter pedido demissão do Ministério da Justiça sem comparecer para uma conversa pessoal. “Torci muito pra dar certo. Muito. Mas, infelizmente, ou felizmente, no dia de hoje, após essa conversa no dia de ontem, até fui sinalizado que ele compareceria na Presidência e seria bem recebido”, disse.
Bolsonaro revisitou ainda desentendimentos antigos. Ele criticou Moro por ser "desarmamentista", confirmando as informações divulgadas ao longo do último ano de que presidente e ministro tinham divergências a respeito dos decretos recentes de flexibilização da posse de armas e compra de munições.
Investigações
O presidente Jair Bolsonaro questionou a atuação da Polícia Federal para solucionar a investigação da faca que sofreu enquanto ainda era candidato à Presidência da República, em 2018, e comparou o andamento com o inquérito sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL), que ocorreu mais cedo no mesmo ano e também não foi totalmente esclarecido.
"Será que é interferir na Polícia Federal pedir a Sérgio Moro, quase que implorar, que investigue quem mandou matar Jair Bolsonaro? A Polícia Federal está mais preocupada com Marielle do que com seu chefe supremo". "Com todo o respeito a todas as vidas do Brasil, a vida do presidente da República tem um significado", disse.
Bolsonaro argumentou que tem poder para interferir nos cargos de segundo escalão, citando mudanças recentes no Inmetro, subordinado ao ministro Paulo Guedes, e a Secretaria da Cultura, ligada ao Ministério do Turismo.
O presidente disse ainda que não tentou proteger familiares e voltou a justificar suas relações com Fabricio Queiroz, ex-chefe de gabinete do seu filho, senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). “Eu conheço o Queiroz desde 1984. Veio trabalhar comigo e com meu filho, o que porventura ele faz, ele responde por seus atos. Por duas vezes, o Queiroz teve dívidas comigo, e ele me pagou com cheques”.
Bolsonaro acenou à Polícia Federal, chamada por ele de "honrada e gloriosa". "Foi a Polícia Federal, com o seu trabalho técnico e preventivo, que foi um elo para a salvação da minha vida. Eu devo a minha vida a esses homens", disse, relembrando o trabalho de segurança durante o período eleitoral.