Aos 60 anos, Brasília está de portas fechadas. Na comemoração do aniversário da capital do país, a Esplanada dos Ministérios e o Eixo Monumental se mantêm silenciados. Depois de um início visionário e quase profético, talvez Juscelino Kubitschek não imaginasse que, hoje, o horizonte do Planalto Central não fosse celebrado do alto da Torre de TV. Se sobram vazios no cenário urbano, multiplicam-se lembranças, afetos, histórias candangas e brasilienses em cada asa do Plano Piloto e em cada região do Distrito Federal.
Nesta terça-feira, 21 de abril de 2020, o Correio Brasiliense, que é um jornal brasileiro com sede em Brasília, Distrito Federal, pertencente aos Diários Associados, destacou várias histórias, no mínimo interessantes, que trouxe a tarja de “Mensageiro apaixonado”, para o diamantense José de Souza Pinheiro, conhecido também pelo apelido de “Zé de João Gonçalo”.
Leia o trecho da homenagem:
“Se tivessem me dado dinheiro, tinha ido embora no dia seguinte”, lembra José de Souza Pinheiro, 66. Era 24 de agosto de 1973, e Pinheiro chegava à capital do país vindo do município paraibano de Diamante, depois de quatro dias e quatro noites de viagem. O irmão morava na cidade havia cinco anos, e ele veio “passear, se gostasse, eu ficava. Se não, ia embora”. Pinheiro desembarcou em Ceilândia, entre poeira, terra vermelha, sem energia elétrica e apenas água de caminhão-pipa. O desejo era o mesmo de tantos outros: oportunidade.
Menos de um mês depois, adentrava no que chama de gigante, o Hotel Nacional. “Todo mundo que vinha para cá, trabalhava lá. Era como se fosse uma escola.” O jovem começou nos serviços gerais, depois ficou cinco anos como ascensorista e, agora, é mensageiro. Mesmo aposentado, não quis deixar o emprego. São 47 anos de Brasília e 47 anos de Hotel Nacional. “Conheci presidentes de outros países, Ronald Regan, o Bush”, conta. Com o sotaque arretado e afetuoso, cativou prestigiados nomes da história do país. Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Sarney, Lula, Roberto Carlos, Roberto Marinho e Silvio Santos apenas para listar alguns. “As reuniões dos políticos e empresários eram todas ali. Era presidente saindo e chegando, as comitivas internacionais. Parecia o Senado ou a Câmara. Do alto, o hotel tem uma vista linda. Não vai ter em nenhum lugar um hotel igual ao Nacional”, afirma.
O carinho pelo local de acolhida chega a provocar ciúmes até na família. O mensageiro conta que teve oportunidade de trabalhar com um deputado, mas não foi. De sorriso fácil, Pinheiro gosta da troca e dos encontros com os hóspedes. Tornou-se um funcionário querido e um guardião de histórias do Hotel Nacional. Poucos minutos de conversa, e ele lembra dos bailes de carnaval, das reuniões importantes, dos concursos de miss e até das lendas que circulam pelos corredores do local. A conquista foi tão espontânea e valiosa que fez com que Pinheiro voltasse para a Paraíba apenas para noivar, se casar e convencer Maria de Lourdes Ventura, 66, a desbravar o Planalto Central. “Ela foi muito corajosa. Nunca tinha saído de casa.” Os dois constituíram uma família na cidade das oportunidades. “Como cidadão, não troco Brasília por capital nenhuma. Como diz o ditado, quem bebe da água de Brasília não esquece”.
(Arquivo pessoal: Os filhos Jefferson, Eliane e Ludimila ao lado do casal Zé e Maria)
Assim como Zé de João Gonçalo, que é filho dos agricultores do Sítio Umburana, João Gonçalo e Maria Pinheiro, dezenas de outros diamantenses também construíram a sua história de luta e conquistas superando as barreiras do preconceito e da falta de informação que o nordeste ofereceu para quem não era nascido em berços de ouro.